Em evidência, todo somos mensageiros dos sonhos de alguém.
Evidentemente, somos cobrados por isso.
Sonhos andantes somos, evidentemente.
Como o calendário, que carrega dentro de si todos as nossas realizações.
“Que lhe brote muito verde lhe visite muito novo e a lembrança da seiva não seja desta última faca enferrujada de velhice mas apenas das épocas de bons frutos” Para a amiga colorida CORTADA - H.G.
Atenciosamente, Réu Confesso
Se, na incerteza de ser se dá o construir de si, certeza terei de que apenas sou o que me convém. No momento de minha construção sou a junção do que sinto no instante eterno, do que fui no meu passado-tesouro e do que serei enquanto invenção constante de viver. Sei apenas o que me cabe saber; do resto somente tenho conhecimento por conta de minha voraz curiosidade. E assim, passo sobre passo, sei que apenas vou ao meu encontro por não saber o que encontrarei na próxima eternidade. Me cabe apenas saber-me porvir.
Acaricie então meus cabelos, com dedos de desejo e olhos de certeza. Certeza de dúvida em se saber vivente em vida. Deixe cair sobre mim um de teus braços pesados e me segure para que eu nunca mais fuja de mim. O faça puramente com a convicção de que eu, me fazendo mulher, sou apenas pimenta no ápice de seu ardor.
No seio de meu desejo está você, quem sufoca todas as minhas noites, quando, sozinha, clamo seu nome sem perdão.
O mundo por si só é muito triste, Dionísio; no fundo, sabes que o é. Mas em teus braços encontro uma utopia, em teus lábios está a fonte de todos os meus quereres.
Juntos construímos um mundo só nosso, cheio de brilhos, cores vibrantes, cheiro de flor. Nosso único dialeto é o gozo conseqüente de nosso ardor. Nossos alimentos são seus braços, minhas pernas, nossas bocas se devorando incessantemente. E assim, desamantes amando, somos felizes por termos encontrado o Eldorado de nossa existência. Por nossos gritos, suspiros e suores, transmitiremos ao mundo acinzentado pelo real quão diferente é a vida de momentos eternos de puro desejo, comparada à brandura dos que se dizem “eu te amo”.
Como um filho edipiano eu te quero. Quero que me possua como a última das mulheres, que no calor de nossos corpos saltitantes, venhas para meu colo encontrar seu refúgio. Que procures em meus seios o néctar do desejo, que brinque com minhas pernas como se nenhuma outra estivesse em suas mãos. Que em minha boca você procure palavas que nunca foram ditas e jamais serão. Que meus cabelos sejam apoio para os altos e baixos de nossos corpos. Que nosso suor seja produto de sons jamais escutados com tanta força, tanto clamor. Que ao final da madrugada, nossas pernas estejam entrelaçadas, dormentes e formigantes. E quando eu voltar para meu ninho, não direi uma só palavra, pois de um filho, passastes a ser o meu primeiro homem.
Eu. Sinto como se parte de mim fsse o nada e todas as possibilidades do mundo. Como se o que me restasse ou seria a inércia ou all that life can bring to me. Decisão, impáfia. Determinação, musculação. Acomodação, solidão, o que me faz sentir viva. O resto é possibilidade. E possibilidade de mais possibilidades. Meu verbo é devir.